14 de agosto de 2009

A Martha tem o dom...


"Não tenho nada a ver com explosões”, diz um verso de Sylvia Plath. Eu li como se tivesse sido escrito por mim.
Também não faço muito barulho, ainda que seja no silêncio que nos arrebentamos.
Tampouco tenho a ver com o espaço sideral, com galáxias ou mesmo com estrelas. Preciso estar firmemente pousado sobre algo — ou alguém.
Abraços me seguram. E eu me agarro.
Tenho medo da falta de gravidade: solto demais me perco, não vôo senão em sonhos.
Não tenho nada a ver com o mato, com o meio da selva, com raízes que brotam do chão e me fazem tropeçar, cair com o rosto sobre folhas e gravetos feito um fugitivo dos contos de fada, a calça rasgando pelo caminho, a sensação de ser perseguido.
Não tenho nada a ver com cipós, troncos, ruídos que não sei de onde vêm e o que me dizem.
Não me sinto à vontade onde o sol tem dificuldade de entrar. Prefiro praia, campo aberto, horizonte, espaço pra correr em linha reta. Ou para permanecer sem susto.
Não tenho nada a ver com boate, com o som alto impedindo a voz, com a sensualidade comprada em shopping, com o ajuntamento que é pura distância, as horas mortas desgastando o rosto, a falsa alegria dos ausentes de si mesmos.
Não tenho nada a ver com o que é dos outros, sejam roupas, gostos, opiniões ou irmãos, não me escalo para histórias que não são minhas, não me envolvo com o que não me envolve, não tomo emprestado nem me empresto.
Se é caso sério eu me dôo, se é bobagem eu me abstenho, tenho vida própria e suficiente pra lidar, sobra pouco de mim para intromissões no que me é ainda mais estranho do que eu mesmo.
Não tenho nada a ver com cenas de comerciais de TV, sou um filme sueco, uma comédia britânica, um erro de adaptação, um personagem que esquece a fala, nada possuo de floral ou carnaval, não aprendi a ser festivo, sou apenas fácil.
Nada tenho a ver com não gostar de mim. Me aceito impuro, me gosto com pecados, e há muito me perdoei.
Não tenho nada a ver com galáxia, mato, boate, a vida dos outros, os comerciais de TV. Meu mundo se resume a palavras que me perfuram, a canções que me comovem, a paixões que já nem lembro, a perguntas sem respostas, a respostas que não me servem, à constante perseguição do que ainda não sei.
Meu mundo se resume ao encontro do que é terra e fogo dentro de mim, onde não me enxergo, mas me sinto.
Minto, tenho tudo a ver com explosões.

Martha Medeiros

Nenhum comentário: